Chegada dos oficiais de Justiça à EFA Bontempo
A
Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil em Minas Gerais (CTB
Minas) se solidariza com a Associação Mineira de Escolas Família-Agrícola (Amefa),
Associação Escola Família Agrícola do Médio e do Baixo Jequitinhonha,
professores e professoras, alunos e alunas da Escola Família Agrícola Bontempo,
em Itaobim-MG, pela tentativa de despejo da escola, ocorrida
no dia 24 de fevereiro. Para a CTB Minas, cabe às autoridades
competentes garantir a todos os cidadãos e cidadãs o direito universal à
educação.
Por volta das 9h daquela sexta-feira, três oficiais de Justiça,
acompanhados de duas viaturas da Polícia Militar, foram até a EFA para executar
a ordem de desocupação solicitada pela Fundação Brasileira de Desenvolvimento
(FBD), presidida pelo padre Felice Bontempi.
Graças à grande capacidade de mobilização do povo do Vale do
Jequitinhonha, cerca de 200 pessoas receberam os oficiais no pátio da EFA
Bontempo, localizada na comunidade Córrego do
Brejo, no km 211 da Rodovia MG 367. Preocupados com a possibilidade de seus
filhos terem de interromper os estudos, pais e alunos se reuniram com os
oficiais de Justiça numa sala, muitos dependurados nas janelas.
As autoridades ouviram as justificativas e argumentos dos presentes
para que a escola continue funcionando no local atual. Segundo os populares,
foram necessários muito suor e mutirões para que a EFA Bontempo fosse
construída, desde as escavações até chegar ao ponto em que se encontra.
“Como vamos sair, para onde levaremos nossos animais, nossa
agricultura? Onde colocaremos os 201 adolescentes que se encontram em ano
letivo?”, questionou um popular. “Precisamos de um espaço para orientar nossos
jovens a não se envolverem com as drogas, com a prostituição. Onde vamos
encontrar este espaço dentro de tão curto prazo estipulado? Quem vai se
responsabilizar por um ano letivo perdido, pelo trauma causado a estes
adolescentes?”, protestou o pai de um estudante.
Diante das reais dificuldades de proceder ao despejo, os oficiais decidiram
fazer um relatório sobre o assunto e encaminhar ao juiz, alimentando a
esperança de pais e alunos da EFA de que a Justiça reconsidere os fatos e as
impossibilidades.
A Associação Escola Família Agrícola do Médio e Baixo Jequitinhonha (Aefambaje), mantenedora da EFA
Bontempo, pediu um ano para se organizar e fazer suas articulações para que, caso
não seja possível continuar no local, ao menos tenha uma saída digna e menos traumatizante.
Outras ações também estão em curso no sentido de garantir a continuidade do
projeto.
Mais de 200 jovens, filhos e filhas de trabalhadores e
trabalhadoras rurais de 23 municípios do Médio e Baixo Jequitinhonha, estudam
na EFA Bontempo. Se a instituição for fechada, os prejuízos para os estudantes
matriculados na escola e suas famílias, que sonham com um futuro melhor para
seus jovens, serão incalculáveis.
Em seus 11 anos de existência, dezenas de jovens se formaram na
EFA Bontempo, muitos deles hoje ocupam vagas nas universidades federais,
movimentos sociais, Emater, IMA, STRs e secretarias de agricultura municipais.
A escola, que tem como princípio trabalhar a educação de forma
diferenciada, mostra, com isso, a importância da educação do campo na vida dos
jovens para a sua inserção na sociedade como um verdadeiro cidadão.
As famílias reiteram o intento de continuar o projeto EFA Bontempo
e querem mantê-la no local atual, pois a escola é um símbolo histórico da luta
dos agricultores e agricultoras familiares do Vale do Jequitinhonha por uma educação
contextualizada.
A Igreja Católica, até o momento, não se posicionou sobre o caso.
Entenda o caso
A Escola Família
Agrícola de Bontempo (EFA) é uma organização comunitária, mantida pela
Associação Escola Família Agrícola do Baixo e Médio Jequitinhonha (Aefambaje),
entidade civil, sem finalidade econômica, criada em outubro de 1999 com a
participação de diversos atores sociais, especialmente, agricultores e
agricultoras familiares, organizados nos sindicatos de trabalhadores rurais e
assentamentos do Baixo e Médio Jequitinhonha, interessados em implementar uma
educação contextualizada, de acordo com a realidade da agricultura familiar do
semi-árido mineiro, utilizando o sistema de formação proposto pelo modelo de
Escola Família Agrícola.
Em 1999, o
trabalho de base foi iniciado com seminários, reuniões e uma pesquisa de
viabilidade da escola, envolvendo sindicatos de trabalhadores rurais,
associações de assentamentos, pólo sindical da Fetaemg, prefeituras, Emater-MG,
entre outros, com a assessoria da Associação Mineira das Escolas Famílias
Agrícolas (Amefa).
Em 2000, a Aefambaje continuou
o trabalho de base e conseguiu um terreno da Fundação Brasileira de
Desenvolvimento (FBD) para construir a rede física da EFA. Este terreno foi doado
legalmente por meio de um contrato de comodato por tempo indeterminado,
enquanto funcionasse a EFA.
Em 2001, as
aulas tiveram início em um local improvisado, emprestado pela própria FBD,
atual Centro Santa Luzia, em Itaobim-MG. Naquele ano, também foi iniciada a
construção dos prédios, com a maior parte dos recursos repassada por uma ONG
Italiana, por intermédio do padre Felice Bontempi, presidente da FBD.
Em 2004, padre
Felice apresentou um novo contrato de comodato, por tempo determinado de três
anos, rescindindo o anterior por tempo indeterminado, alegando que não
interessava mais a parceria e que os prédios deveriam ser destinados à
implantação de uma faculdade.
A Aefambaje não
aceitou o novo contrato, por entender que o Projeto EFA corresponde a um apelo
social por educação apropriada à realidade da juventude camponesa da região. A
FBD, então, notificou judicialmente a Aefambaje, em 01/09/2004, dando um prazo
de 29 meses para que o prédio fosse desocupado (Processo 048704008444-3 - Comarca
de Medina-MG).
Em 2007,
espirado o prazo, o juiz de Medina, expediu um mandado de reintegração de
posse. A EFA resistiu ao despejo e conseguiu um tempo para negociar e se
defender.
Em 19 de maio de
2008, foi concedida sentença em favor da FBD, com o despejo podendo ocorrer a qualquer
momento, devido a um novo mandado de reintegração de posse (Processo
041407016973-8).
Em 2008, após quatro
anos sob judice, a EFA Bontempo funcionava com 117 jovens em quatro turmas, fazendo
o curso Técnico de Nível Médio, com Habilitação em Agropecuária, em regime de
alternância.
A EFA Bontempo é
reconhecida pela Secretaria de Estado de Educação de Minas Gerais, cadastrada
no MEC e autorizada pelos órgãos competentes desde quando passou a funcionar,
em 2001. Uma declaração da inspetora de Ensino da Superintendência Regional de
Ensino de Araçuaí atesta que a EFA continua a funcionar com suas finalidades
educacionais.
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