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Familiares ainda buscam notícias dos desaparecidos
na tragédia de Mariana. Muitos sobreviventes que perderam suas casas estão
abrigados em hotéis e pousadas do município.
Por Anderson Pereira
“A Samarco não fala nada e fico sabendo de
informações pela imprensa. Estou perdida no tempo”.
O desabafo é de Aline
Pinheiro, de 33 anos, que foi em Mariana no último domingo buscar informações
sobre o marido Samuel Vieira Albino, de 34 anos, que está desaparecido desde o
dia do rompimento das barragens da Samarco – mineradora que pertence a Vale e a
BHP Billinton – ocorrido em 05 de novembro.
Samuel
era operador de máquina de sondagem na Geotécnica – empresa terceirizada que
trabalha para a Samarco - há um ano e meio. Ele morava com a família em Ribeirão
das Neves, cidade da Região Metropolitana de Belo Horizonte, e tinha quatro
filhos (dois meninos e duas meninas, entre 2 e 13 anos).
Aline Pinheiro pede informações para o prefeito de
Mariana, Duarte Júnior (PPS), e um representante da Samarco
No dia da
catástrofe, ele estava na barragem que se rompeu, a de Fundão, na companhia do
colega Claudemir Elias dos Santos que trabalhava na Integral Engenharia, outra
empresa terceirizada da Samarco. O corpo de Claudemir foi encontrado há 100 km
de Mariana.
O número
de vítimas e pessoas desaparecidas até aqui dá a dimensão da maior tragédia
ambiental já ocorrida em Minas Gerais. Doze pessoas ainda não foram
encontradas, sendo nove trabalhadores da Samarco. Onze mortes já foram
confirmadas e cerca de 600 pessoas que moravam no distrito de Bento Rodrigues
estão abrigadas em hotéis e pousadas de Mariana.
No início
desta semana, a lavradora Maria das Graças Barbosa de Matos, de 57 anos, tomava
café, sozinha, numa das mesas num pequeno refeitório de um hotel situado a
poucos metros da rodoviária de Mariana.
Dona
Maria, de cabelos negros compridos e um rosto com traços fortes, morava em
Bento Rodrigues há 35 anos. No dia da tragédia, ela acordou cedo, antes das 6h,
e às 7h já trabalhava entre plantações de milho e cana. Em casa durante a
tarde, ela recebeu um telefonema após o banho. Era o genro, funcionário da
Samarco, avisando que uma das barragens da empresa tinham se rompido. “Peguei o
meu neto de oito anos que estava comigo e sai correndo”, lembra ela.
Dona Maria das Graças Barbosa e o marido estão abrigados
num dos hotéis de Mariana
Na rua,
ela se deparou com outras pessoas também correndo para se salvar. “Muitos
passaram nas casas avisando, aos gritos, que a barragem tinha estourado”,
recorda ela.
Já a dona
Neuza Maria de Souza Inácio, de 54 anos, morava no distrito de Bento Rodrigues
há 33 anos. Ela assistia TV em casa antes da imensa onde de lama invadir o
pequeno distrito. Do lado de fora, seus três filhos conversavam. “Em seguida”,
lembra ela, “o chão começou a tremer e o vento fazia a copa das árvores
‘dançar’ de um lado para o outro. Ao longe, a gente via uma nuvem de poeira se
aproximando. Na hora, pensei que fosse a chegada de um helicóptero até que um
dos meus filhos gritou”:
- A
barragem estourou! A barragem estourou! Vamos sair, vamos sair...
Sem
alarme
Amanda
Aparecida do Carmo, de 17 anos, também estava em Bento Rodrigues no dia da
tragédia. Ela, a irmã, a filha de um ano e dois meses e alguns amigos
conseguiram escapar graças a um telefonema de um parente que trabalha na
Samarco.
“Ele
ligou desesperado e gritou”:
- Sai de
casa agora que a barragem estourou.
Durante
alguns minutos, ela pensou que pudesse ser uma brincadeira.
“Na hora
fiquei sem entender. Mas depois fui para a rua e vi uma nuvem de poeira se
aproximando e um barulho de água, como se fosse de uma cachoeira próxima.
Graças a esse aviso, conseguimos sair com vida. Mas a empresa não avisou, por
isso fica o sentimento de revolta. Eu gostava de morar lá”, diz ela.
A
lavradora Maria das Graças também não ouviu nenhum sinal de alerta emitido pela
empresa.
Amanda
conta que correu para a parte alta de Bento Rodrigues, assim como os outros
moradores, e ficou lá até ser resgatada pelo Corpo de Bombeiros. De lá, ela viu
a onda de lama que, em poucos minutos, destruiu tudo por onde passou.
“Nesse
momento, a gente sempre escutava o barulho de uma casa caindo. Foi horrível”.
Mas nem
todos conseguiram se salvar. Thiago Damasceno dos Santos, de sete anos, foi uma
das vítimas após o rompimento da barragem. O tio do garoto, Alexandre
Damasceno, resume o sentimento da sua família e porque não dizer das outras
atingidas por essa tragédia: “Queremos justiça”.
Nota
Em nota
divulgada para a imprensa, a empresa Samarco informou que avisou os moradores
de Bento Rodrigues sobre o rompimento das barragens por telefone. A empresa,
porém, não soube informar quantas pessoas foram avisadas.
Capital
Mariana
foi a primeira capital de Minas Gerais e está localizada na região central do
Estado, a 120 km de Belo Horizonte, e tem uma população estimada pelo IBGE de
58.802 habitantes. Assim como outros municípios mineiros, é altamente
dependente dos recursos da mineração (mais de 80%). A atividade é responsável por
cerca de 4 mil empregos na região.
Muitos
moradores de Bento Rodrigues também trabalhavam na Samarco. O distrito ficava
distante 35 km de Mariana e era formado por gente simples. Abrigava casas de
arquitetura colonial, cachoeiras e pequenas propriedades rurais.
Nas ruas de
Mariana, o clima entre os moradores é de incerteza, resignação, tensão e também
de solidariedade. No Centro de Convenções do município, o volume de doações
entre roupas, material de limpeza e calçados era grande. Tanto que, no último domingo,
voluntários que trabalhavam no local informavam que novas doações estavam
suspensas.
A prefeitura de Mariana também informa, por meio de nota, que novas
doações de roupas, mantimentos, água, produtos de higiene, dentre outros, devem
ser encaminhadas ao Serviço de Voluntariado da Assistência Social
(Servas), em Belo Horizonte. “O Servas está direcionando os
donativos para outras cidades atingidas pelo rompimento das barragens em
Mariana”.
Prefeito de Mariana, Duarte Júnior (PPS), ao lado da
presidente do Ibama, Marilene Ramos. Maior tragédia ambiental de
Minas Gerais.
Risco de novo acidente
O Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM) constatou que a barragem
de Santarém, que compõe o complexo da Samarco em Mariana, não se rompeu,
conforme havia sido anunciado pela mineradora. Segundo o órgão, embora a
barragem tenha resistido, a estrutura ficou tomada pela lama que saiu de Fundão
e sofreu erosões que podem levar a um desabamento. Em uma escala de risco de 0
a 10 (quanto maior o número, maior o risco), o reservatório atingiu a pontuação
máxima, segundo o DNPM.
Estado de Calamidade
Em
virtude dos desdobramentos causados pelo acidente envolvendo a mineradora
Samarco, a prefeitura de Mariana decretou, no dia 14/11, estado de Calamidade.
Danos
A
barragem de Fundão se rompeu por volta das 16h20 no dia 05 de novembro. O
volume de lama que invadiu o distrito de Bento Rodrigues teria chegado a 2,5 m
de altura. A lama de rejeitos destruiu outros distritos de Mariana, como o de
Paracatu de Baixo, destruiu rios, como o Rio Doce, e deixou dezenas de pessoas
sem água potável ao longo de várias cidades de Minas Gerais e do Espírito
Santo. Os danos causados ao meio ambiente são, até aqui, incalculáveis.